Mieloma Múltiplo aos 29 anos de idade: Apresentação de 1 caso

Heloisa Helena Arantes Gallo*

Maria Vommaro**

José Ventura Ramos***

Sandra Chalhub****

 

Rev. Inst. Est. Hem. “Arthur de Siqueira Cavalcanti”,8(1/2): 12-15,1991

 

ABSTRACT

A young woman found to present Multiple Myeloma(MM). Because she was 29 years old the diagnosis was not considered initially until a biopsy of a sacral tumor turned to be MM. She also presented clinical features of the disease and the immunoelectrophoresis was consistent with a monoclonal globulin IgG type.

 

INTRODUÇÃO

O mieloma múltiplo (MM) é uma neoplasia clonal de células B que afeta as últimas células da diferenciação da célula B, ou seja, os plasmócitos em diferentes estádios de diferenciação. Pode se apresentar em uma fase inativa com uma pequena percentagem (menor que 1%) CE células plasmablásticas e uma fase fulminante com  uma ocorrência freqüente de tumores extramedulares  plasmablásticos A incidência na população é de 3/100.000 por ano. É uma doença que atinge principalmente  pessoas com idade entre 60 e 65 anos de idade, podendo acometer pessoas com 40 anos,sendo bem rara sua apresentação em indivíduos com menos de 35 anos de idade. Segundo a experiência da Clinica Mayo somente 0,3% dos pacientes com MM tem menos de 30 anos de idade.

Relato do Caso:

Mulher de 29 anos de idade, parda, natural do Rio de Janeiro, internada em 21.11.1990 com história de dor na região lombo-sacra, com 6 meses de duração, irradiada para membro inferior esquerdo, com piora progressiva que a levou a impossibilidade de deambulação. Não havia história de febre ou emagrecimento. O diagnóstico de MM foi feito após biópsia de tumoração na região sacra.

O primeiro hemograma revelou 3.750.000 hemácias/mm3, hemoglobina de 11,6 g/dl, Ht de 35%; leucometria de 8.500 leuc/mm3, forma leucocitária normal. O VHS era de 90 mm na  primeira hora; contagem de plaquetas: 229.000/mm3. O estudo da punção aspirativa da medula óssea mostrou infiltração por células plasmáticas, a maioria pró plasmócitos, plasmócitos mono e binucleados, rouleaux pronunciado.

O exame histopatológico da biópsia da tumoração sacra  revelou proliferação difusa de plasmócitos, com formas binucleadas e infiltração do músculo esquelético.

Dosagem de imunoglobulinas: IgG= 8.450 mg%; IgA= 309 mg% e IgM= 168 mg%. Uréia: 19,6 mg/dl; LDH: 60 U; proteinúria de 24 horas= 210 mg; proteinúria de Bence Jones= negativa. O RX do esqueleto demonstrou osteoporose, lesões líticas na calota craniana, no quarto arco costal esquerdo; no nono arco costal direito e no sacro à esquerda, junto à articulação sacro-ilíaca. Tumoração de sacro insuflante, com rompimento de cortical. Tomografia computadorizada de coluna lombar, sacra e pelve: foram realizados cortes da pelve, segmento lombar inferior e do sacro que mostraram: lesão lítica extensa de sacro, comprometendo o lado esquerdo de S2 e S3, o corpo do ilíaco inferiormente e junto à articulação com o sacro deste lado. Infiltração de partes moles adjacentes (plano muscular) e imagens nodulares do oco pélvico em topografia de cadeia ganglionar esquerda, sugerindo linfoadenomegalias.

Iniciou o tratamento co radioterapia na região sacra, recebendo dose de 400cgy entre  13/12/1990 a 05/01/1991. Concomitantemente recebeu quimioterapia (Vincristina, Melfalan, Ciclofosfamida e Prednisona) em ciclos mensais que continua até o momento. Atualmente, deambulando normalmente referindo dor somente ao levantar-se

Discussão

A maioria dos trabalhos sobre MM tem apresentado séries de pacientes acima de 30 anos(4). Há um relato de três pessoas jovens, com idades de 17,22 e 20 anos, de um total de 367 pacientes, mostrando que a incidência da doença em pessoas jovens é menor que 1%(2).Outros trabalhos relatam pacientes de 8(2),4(7), 14(4) e 7 anos(5), porém  em nenhum destes casos o diagnóstico ficou confirmado. Outros dois trabalhos foram descritos (8,6) mas sem estudos eletroforéticos.. De 1959 até a presente data 132 casos foram diagnosticado de MM no IEHASC, destes somente 4 apresentavam a idade igual ou inferior a 35 anos. Um destes, diagnosticado aos 34 anos de idade apresentava MM e do tipo IgG e faleceu após 23 anos do início da sua doença. Outro, com 34 anos, também com MM do tipo IgG abandonou o tratamento após 1 ano e 5 meses de evolução. Outra paciente com 35 anos de idade encontra-se ainda em acompanhamento 1 ano e 6 meses após o diagnóstico (mieloma IgG). O outro é a paciente acima descrita.

A paciente em questão apresentava-se com manifestações clínicas de MM, porém devido a sua idade, não se cogitou o diagnóstico. Mesmo após a biópsia o diagnóstico só foi firmado com o estudo eletroforético, o mielograma e o estudo radiológico.

Está relatada uma capacidade de sobrevida maior associada a pacientes mais jovens. Weksler e Hutteroth(9) demonstraram que os linfócitos de indivíduos mais idosos tem uma resposta mitogênica diminuída à mitógenos de plantas e linfócitos alogenicos. Como a paciente está sendo acompanhada clinicamente há pouco tempo, aguardaremos a evolução do caso, já que no relato de Hewell(1) a sobrevida foi semelhante aos demais pacientes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA

1-Hewell GM, Alexanian,R: Multiple myeloma in Young patients. Ann. Inter. Med. 84:441-443,1976

2-Jacoby P: Myelomatosis in a child of 8 years. Acta radiol. 11;224-232,1930.

3-Kaufman J: Isolated myeloma in a forteen years old boy. Am. Surg. 69:129,1945

4-Kyle,RA : Multiple Myeloma. Mayo Clinic Proc, 50:29-40,1975

5-Porter, FS:Multiple Myeloma in a child. J Pediatr. 62:602-604,1963

6- Rubinstein MA: Multiple Myeloma as a form of  leukemia. Blood. 4:1049-1067;1949

7- Slavens JJ. Multiple Myeloma in a child. Am. J. Dis. Child, 47;821,1934

8-Waldenstrom J: Diagnostic and treatment of multiple myeloma. New York, Grune & Stratton,1970,pg 1

9- Weksler ME & Hitteroth TH; Impaired lymphocyte function in aged humans. J. Clin Inv.53;99-104,1974.

 

*Chefe da Seção de Clínica do Serviço de Hematologia do IEHASC

 

**Médica da Seção de  Clínica do Serviço de Hematologia do IHEASC.

*** Médico Residente do Serviço de Hematologia Clínica

****Médica Estagiária da Seção de Clínica do Serviço de Hematologia